• O Legado de Marielle Franco
    v. 4 n. 7 (2019)

    Editorial da sétima edição

    O objetivo dessa edição é homenagear Marielle Franco, ex-aluna da PUC-Rio, publicando artigos científicos com temáticas que circundam as suas pautas de lutas e de vida. A Dignidade Re-Vista é um periódico acadêmico destinado ao debate interdisciplinar sobre os Direitos Humanos e valores cristãos e nesta edição contamos com 14 artigos, 2 entrevistas e 1 resenha. Para que essa publicação ocorra foi necessária a participação de 23 autoras e autores, 6 entrevistadores.

    Os artigos “A administração da morte de Marielle Franco por parte do Estado” e “O enfrentamento aos grupos de extermínio e às milícias no Rio de Janeiro” analisam as narrativas da polícia e da Comissão Parlamentar de Inquérito das Milícias sobre a investigação da execução, assim como o trabalho de diferentes instituições no processo de investigação. Já outro artigo investiga discursos redutores da figura da vereadora, colocando-a apenas como “mais uma vítima da violência no Rio de Janeiro” levando à negação da dimensão simbólica do caso, com o nome “‘Mais uma vítima?’: Discurso do medo no Rio de Janeiro e a negação da dimensão simbólica da morte de Marielle Franco”.

    Em sequência, temos o artigo “Disputas narrativas pela memória de Marielle”, que discute a memória coletiva formada em torno dos eventos públicos em constante disputa política, que busca refletir sobre algumas das diferentes forças e motivações por trás dos discursos que surgiram após o assassinato da vereadora. “As fake news e o Estado pós-democrático de direito: desafios à proteção de defensoras e defensores de direitos de dignidade” apresenta como as notícias falsas podem ser utilizadas enquanto eixo de desarticulação das lutas das defensoras e defensores de direitos de dignidade. E o artigo “Aproximações entre Foucault e Mbembe: a bio/necro política no devir sujeito dos que não importam” demonstra que o conceito de biopolítica de Foucault é a base para a necropolítica do Mbembe.

    Na chave de respeito e valorização das diferenças étnicas e socioeconômicas está o artigo “A vivência e subjetivação de bolsistas negros em uma universidade privada de elite”, que investiga os aspectos da vivência e subjetividade de alunos bolsistas negros dentro de um ambiente universitário tomado como espaço de elite. Este artigo dialoga com a Marielle universitária, bolsista da PUC-Rio. E também trouxemos o artigo “A inconstitucionalidade das Leis Municipais que proíbem o ensino da chamada ‘Ideologia de Gênero’”, que tem como objetivo principal expor a incompatibilidade da Constituição Federal com as leis municipais que visam abolir da sala de aula a discussão sobre gênero.

    Além disso, há trabalhos que enfatizam a dimensão cristã presente no exemplo de vida e na militância política de Marielle Franco como o trabalho “A mística profética de Marielle Franco”.  A homenageada desta edição teve uma vida dentro da Igreja Católica como catequista e esse artigo ressalta o aspecto profético de sua vida e luta. E o trabalho “A manhã renascer esbanjando poesia: arte e resistência” discute os ataques à intelectualidade e à arte, mas que traz uma perspectiva de esperança e força para resistir.

    Finalmente, temos um conjunto de artigos sobre a mulher e os Direitos Humanos. São os artigos “Brasil o seu nome é Dandara, o legado de Marielle e a luta por direitos humanos e cidadania para mulheres negras”, que demarca o legado de luta que Marielle deixou, em busca da representatividade política das mulheres negras no Brasil. O trabalho “Pensando a interseccionalidade a partir da vida e morte de Marielle Franco”, que comenta como Marielle teve uma experiência interseccional e militava de forma integral como mulher, negra, pobre e com uma relação homoafetiva. E “Identidade e representatividade na trajetória e no discurso de Marielle Franco”, que busca compreender quais são os efeitos políticos e sociais que ela, enquanto figura política e social, causou na esfera pública e privada e também entender quais são os impactos da luta das mulheres na história, no discurso e na trajetória política de Marielle.

    Nesta edição, também trazemos duas entrevistas e uma resenha. Uma das entrevistas é a “A trajetória de Marielle Franco na graduação em Ciências Sociais na PUC-Rio: uma entrevista com Ricardo Ismael” e a outra é a “Entrevista com Talíria Petrone sobre o legado político de Marielle Franco”. A resenha publicada é “O que é lugar de fala?” sobre o livro de Djamila Ribeiro com o objetivo de analisar o racismo no Brasil e a importância do feminismo negro.

    Editorial produzido por: Maria Rafaela Paixão

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    Texto de apresentação da sétima edição - Produzido por Anielle Franco

    Lutemos

    Hoje milhares de pessoas gritam “Marielle Presente”. E de certa forma, esses gritos tornaram-se um ato de resistência para muitas e muitos. Mas isso requer coragem. Não é qualquer pessoa que assume lados e toma para si responsabilidades de luta e militância nos dias de hoje. Não é qualquer pessoa que decide estar ao lado da resistência, ao lado de quem luta pelos direitos dos humanos, e ao lado de quem clama por justiça por um crime político. Pedir justiça por Marielle é como lutar por muitos grupos de minorias que ela representava arduamente em sua trajetória política e de vida. Grupos esses que, na verdade, são maioria nesse país afora. Passado um ano e alguns meses, percebemos um movimento iniciado por essa morte trágica e covarde, que invade o peito de milhares de pessoas fazendo com que sigam muito mais fortalecidas, juntas, firmes, e ecoando uma só voz: a voz de Marielle Franco.

    Voz essa que pode ser lida e sentida através dessa edição da revista acadêmica da pastoral universitária, que traz em poucos textos um breve resumo das causas e tudo mais que permeava a vida de Marielle. Temas que vão desde a administração da morte até a identidade e representatividade que ela trazia. Essa voz que impunha respeito, o fim dos padrões, e um combate constante ao racismo, patriarcado e a hétero normatividade. Essa voz que alguns insistem tanto em tentar calar. Na verdade, apenas insistem, mas não conseguem. Pois são trabalhos como estas publicações que nos dão ainda mais forças para seguirmos. Seguimos na dor, mas seguimos. Seguimos ecoando a voz de Marielle, mostrando sua essência, seus valores, sua trajetória, mesmo na dor, no preconceito, no racismo, no desrespeito. Seguimos com muito orgulho por termos a Mari sendo homenageada nessa edição da Dignidade Re-vista e ainda mais por saber que tantos jovens e tantas pessoas lerão artigos que contam um pouco de quem ela é. Mas seguimos, acima, de tudo com esperança de dias melhores.   

    Mataram Marielle, e arrancaram de nós uma mulher que trazia em si todo afeto e comprometimento político que eu jamais vi em outra pessoa. Mataram também a filha, a mãe, a tia, a esposa, a madrinha e a irmã.  Eu queria que isso tudo fosse só um pesadelo, mas já tem mais de um ano desde o momento em que eu cheguei naquela rua no Estácio. Já tem mais de ano desde que eu recebi uma ligação que mudaria completamente minha vida para sempre. Já tem mais de um ano desde que eu ouvi e vi seu último sorriso largo, me chamando de “naninha”. Já tem um ano desde que almoçamos pela última vez e falamos sobre todos os nossos medos, anseios, expectativas, amores, sonhos e metas. Um ano inteiro e mais um pouco de saudade, dessa tragédia fatídica, angustiante e triste. E assim tudo mudou. Tudo mesmo!

    Nesse ano, o que fizemos com nossa saudade e nosso luto foi algo que aprendemos com Marielle. A força daquela mulher veio da força da própria família, que, desde nossa bisavó, sempre lutou contra o machismo e estereótipos em seus momentos mais difíceis. Uma força que todo mundo percebia e admirava, do momento em que chegava até o momento em que saía. Hoje trago comigo memórias de uma irmã que sempre teve caráter, valores, um coração gigante, força, afeto, e que lutou incansavelmente por tempos melhores. Por isso, eu hoje sigo construindo nosso Instituto Marielle Franco e buscando ser um terço do que ela foi e sempre será. Dessa forma, eu espero que essa leitura fortaleça você, leitor ou leitora, tanto quanto a mim. Mesmo no meio de um turbilhão de coisas, nossa persistência em carregar o legado é grande.

    Vamos em frente, na luta, na leitura, na mudança, na saudade, mas também com muito aprendizado e orgulho. Aprendemos que nossa luta vale a pena e que nossos valores devem nos acompanhar sempre. E me orgulho de ver o que ela se tornou e a maneira como invadiu esse mundão. Orgulho-me também em ver seu trabalho alcançando diversos países, mesmo que na sua ausência. E orgulho-me, ainda mais, em saber que minha mãe gerou aquela mulher e eu pude conviver com ela por 35 anos, tendo acesso ao seu lado político, de mãe, esposa, filha, amiga e irmã.

    No meu peito, hoje, eu só tenho uma opção: seguir! Seguiremos lutando. Lutando por justiça e dignidade. Não nos calaremos diante de tantas atrocidades, e não recuaremos mesmo em tempos de fascismo. Por Marielle, eu luto, tu lutas e nós lutaremos.

    Sigamos!

    (Anielle Franco)

  • Arte, Liberdade de Expressão e Direitos Humanos
    v. 3 n. 6 (2018)

    A 6a edição da Dignidade Re-Vista trará como tema do Dossiê Temático: Arte, Liberdade de Expressão e Direitos Humanos. Arte é fonte de renda, é liberdade de expressão, é lugar de encontro, é ar que se respira. Ela é lugar de resistência, é lugar de afirmação, acolhimento e espelho da diferença e da diversidade que existe no mundo. Arte não combina com contextos autoritários ou ruas sem saída, é porta de entrada. Arte é o graffiti pintado nos muros, é a frase escrita no muro dialogando com a cidade e resinificando o espaço urbano. Por tudo isso, a arte é fundamental na construção de um mundo em que Direitos Humanos tenham valor e estejam sempre na ordem do dia.

    Nesta edição inauguramos a seção de Fluxo Contínuo que visa ampliar o espaço de submissão bem como divulgar artigos que construam conhecimento acerca dos Direitos Humanos em sua amplitude temática. 

    Neste contexto, com grande satisfação, anunciamos o sexto número da Dignidade Re-Vista e convidamos os universitários, em especial os estudantes de graduação, a enviarem artigos apresentando diversas abordagens e discussões acerca dos temas. A Pastoral Universitária Anchieta, através de sua revista eletrônica, quer continuar o incentivo à escrita científica ao corpo discente da PUC-Rio, bem como de outras universidades, em seus diferentes campos de estudo. Acreditamos que a escrita científica é uma eficaz forma de estimular a reflexão sobre valores.

  • Olhares universitários sobre a Laudato Si'
    v. 3 n. 5 (2018)

    A atualidade expressa um momento único em que, por um lado, a humanidade se desenvolveu criando um arcabouço técnico-científico sem precedentes e, por outro, este crescimento ocorreu de forma desigual, criando milhões de excluídos à margem dos benefícios tecnológicos existentes. Esta contradição se espelha em nossa Terra Comum através da interferência nos sutis mecanismos que regem a dinâmica da vida.

    Ações locais geram a produção ingovernável de lixo, poluição generalizada no ar, na água e na terra. Opções energéticas globais geram subprodutos que, no seu conjunto, identificam a atualidade como uma nova era denominada Antropoceno, dinamizada pelas mudanças climáticas decorrentes das ações desconectadas da humanidade.

    A Encíclica Laudato Si’ aprofunda esta percepção, estabelecendo a relação indissociável entre as questões ambientais e sociais, se fundamentando no conceito multiescalar da ecologia integral em que as ações individuais e coletivas devem propiciar desenvolvimento equânime integrado com os limites biofísicos do nosso planeta.

    A universidade, no seu contexto especializado, responsável por transmitir conhecimento e valores, bem como desenvolver visões que possam contribuir para o desenvolvimento humano, encontra na Laudato Si’ um norte ético, sólido e consistente, permitindo que diferentes inciativas de ensino e pesquisa se permeiem, baseados na interdisciplinaridade e no conjunto que expressa o conceito da ecologia integral. A integração do conhecimento na universidade não é uma questão simples, considerando o alto nível de especialização das disciplinas. A inserção de questões transversais proposta na Laudato Si’ é um caminho claro no desenvolvimento de conhecimentos integrados, sistêmicos e democráticos, em que as pesquisas e o pensar devem estar em sincronia.

    A Dignidade Re-Vista, nesta edição, “Olhares Universitários sobre a Laudato Si’”, mostra de forma clara o potencial desse horizonte, apresentando onze artigos que tratam da questão em si e de seus desdobramentos.

     Na escala conceitual, seis artigos tratam de temáticas expressas na Laudato Si’: “Analisando a Carta Encíclica Laudato Si’”, “Considerações do humano e do ambiental no contexto antropocêntrico moderno”, “Ainda temos tempo de cuidar de nossa casa”, “Círculo vicioso – o bem comum ameaçado pelo excesso de lixo”, “Genetically modified organisms” e “Influência dos meios de comunicação na massificação do consumo e os impactos na sociedade”.

    Cinco artigos focaram a Laudato Si’ diretamente relacionada à Universidade ou em técnicas específicas que contribuem para a preservação de Nossa Casa Comum:Laudato Si’ a luz em nossa Universidade”, “Indicadores de Sustentabilidade em Instituições de Ensino Superior”, “Cadeia reversa do óleo de cozinha residual: o papel do Ponto de Entrega Voluntária”, “Sustentabilidade de dentro para fora: as pessoas também são a nossa casa comum” e “Reaproveitamento da água dos aparelhos de ar-condicionado”.

    Esses onze artigos compõem diferentes percepções, originárias de diferentes especialidades do conhecimento, que se alinham e se articulam, construindo partes de um todo sistêmico e sustentável nas perspectivas sociais, culturais, econômicas e ambientais, como solidificado no conceito de ecologia integral expresso na Laudato Si’.

    Assim, esta edição corrobora o compromisso que a Dignidade Re-Vista e o Nima mantêm com a reflexão e produção da escrita científica, pelos estudantes universitários da PUC-Rio, sobre as ações propostas pelo papa Francisco na encíclica Laudato Si’.  E solidificamos nossa parceria estimulando, em especial, a primeira experiência destes estudantes com a produção científica. 

     

    Prof. Luiz Felipe Guanaes Rego

    Diretor do NIMA

     

  • Pluralismo Cultural e Religioso
    v. 2 n. 4 (2017)

    O ser humano é chamado a viver em comunidade. Fazemos parte de um todo e estamos em profundo contato com o diferente. Para que possamos viver de maneira democrática em meio a esta sociedade plural, é necessário conhecer e, ao mesmo tempo, respeitar a diversidade, o pluralismo e as diversas expressões culturais que formam a sociedade. O Brasil é composto por esta multiplicidade de valores, raças, crenças e tradições, e contemplar cada região brasileira nos ajuda a compreender e a compor este rico mosaico onde a diversidade torna-se o tom que dá vida a toda esta obra de arte.

    O pluralismo cultural verificado na sociedade brasileira, que tem em sua origem a miscigenação de povos, carrega consigo fortes marcas da fé, visto que, por muitas vezes, traduz-se em uma diversidade de crenças. Cultura e religião, historicamente, caminham juntas e, portanto, influenciam-se mutuamente. Tendo isso em vista, é evidente a necessidade de buscar, tanto na heterogeneidade cultural como na religiosa, as respostas para superar os preconceitos propagados em nossa sociedade e compreender as diferenças que nela subsistem.

    A Pastoral Universitária Anchieta incentivou o corpo discente da PUC-Rio, em seus diferentes campos de estudo, a desenvolver artigos de cunho científico, com base nos Direitos Humanos, que abordem o tema “Pluralismo Cultural e Religioso”. É nosso objetivo com o tema proposto, que o estudante reflita e tome cada vez mais consciência da importância e do exercício dos Direitos Humanos diante da diversidade cultural e religiosa que enriquece a sociedade. 

  • Da natureza à justiça social: desafios socioambientais
    v. 2 n. 3 (2017)

    Continuando um projeto iniciado há um ano, temos a grande alegria de anunciar o terceiro número da Dignidade Re-Vista, periódico da Pastoral Universitária que visa publicar artigos relativos à temática Direitos Humanos. Neste número tratamos sobre questões socioambientais, assunto este que surge como um dos principais desafios para o ser humano do século XXI, não apenas na perspectiva de um futuro, mas no próprio presente que revela a destruição dos mais variados tipos de vida, seja ela vegetal, animal ou humana.

    Os problemas socioambientais dialogam diretamente com aspectos substanciais da sociedade constituída no século XIX e consolidada no século XX. É possível elencar aqui o consumo, a produção em massa em detrimento dos diferentes ecossistemas e o advento técnico capaz de reproduzir fenômenos da natureza, o que gera, como consequência, relações de causa e efeito que escapam ao controle humano, tal como é possível identificar no que se refere ao aquecimento global. Estes três não podem ser vistos separadamente, já que a existência de um depende do outro: a produção em massa visa ao consumo e o aprimoramento técnico busca melhorar a produção. Ao analisá-los em conjuntos com os problemas socioambientais, somos conduzidos a perguntas importantes: “o que é bem viver?”; “o que é a felicidade?”; “existe algum fim para a existência humana?”. Ora, de algum modo queremos convidar os leitores a terem estas perguntas presentes ao tomarem contato com os artigos publicados neste número.

    Importante ressaltar também que a discussão dos desafios socioambientais envolve os Direitos Humanos. Isso ocorre na medida em que o tratamento dado a tais questões perpassa as políticas públicas que podem ser adotadas para a superação de problemas que atingem a natureza e repercutem na diminuição de uma vida digna a que todo cidadão tem direito. Áreas urbanas com saneamento básico, por exemplo, não apenas protegem o solo e os rios que são fontes para o alimento de muitas comunidades, como também proporcionam uma melhor qualidade de vida para a própria cidade e seus respectivos bairros. Da mesma forma o nível de poluição do ar influencia na saúde ou na disposição que o indivíduo tem ao longo do dia.

    Por fim, queremos lembrar aqui que a centralidade dos problemas socioambientais aparece na encíclica papal Laudato Si. O papa Francisco chama a atenção para o modo de vida que a sociedade atual adotou e de que forma ela repercute na natureza e, consequentemente, na existência da vida na própria terra. Neste sentido, cada indivíduo é dotado de um compromisso para com a preservação do planeta. Assim como o texto do papa, queremos despertar em cada leitor um senso de responsabilidade socioambiental, esperando deste modo contribuir para a formação de uma sociedade mais consciente e justa.

  • Relações Trabalhistas e os Direitos Humanos
    v. 1 n. 2 (2016)

    Editorial

    Este é o segundo número do Dignidade Re-Vista, periódico acadêmico destinado a debater questões relativas aos Direitos Humanos. Nesta edição temos como temática as dimensões trabalhistas e os direitos humanos. Tal abordagem torna-se cada vez mais importante perante um quadro de crise econômica e política em que, de um lado, cresce o desemprego e, de outro, medidas econômicas são adotadas afetando direitos dos trabalhadores. A complexidade da questão obviamente afeta aquilo que se refere às condições de uma vida digna. Talvez o grande dilema desta época seja de que maneira superar a crise sem que direitos sejam violados. Neste sentido, a proposta desta edição visa trazer um olhar mais amplo acerca das relações de trabalho em consonância com os direitos humanos a fim de proporcionar uma melhor reflexão e debate mais amadurecido na sociedade.

    Sendo assim, a dimensão do trabalho está para além da relação empregador e empregado. Antes de tudo, válido recordar que o trabalho é um direito de cada ser humano para poder ter acesso a uma vida digna, um elemento fundamental que oferece a possibilidade de autonomia e autodeterminação. Este olhar se torna mais consistente na medida em que este direito deve estar acompanhado de noções como qualidade de vida e condições mínimas para que o indivíduo possa ser livre, alcance um nível de igualdade na sociedade e tenha a sua integridade psicofísica garantida. São estes elementos que separam o trabalho escravo de um trabalho digno e, por isso, válido atentar aqui que existem populações vulneráveis que estão passíveis de sofrerem abusos que os submetam a condições degradantes. Neste sentido, o texto de Francisco Veras Junior deixa ao leitor a reflexão de que maneira o direito ao trabalho digno é “condição fundamental para a integração da população refugiada no Brasil”. Não apenas os refugiados estão sujeitos a trabalhos escravos, mas também determinadas profissões esbarram com desafios que revelam padrões de condutas que têm origem em um passado histórico que faz referência ao tempo da escravidão. É o que ocorre com a empregada doméstica que muitas vezes é exposta a situações abusivas por parte de seus patrões, tal como observa Lorena Muniz em seu artigo.

    Outrossim importante observar que existem trabalhos que são exercidos não pela escolha individual, mas pelo simples fato de ter sido uma das poucas possibilidades que a vida apresentou. Em geral estes trabalhos já possuem uma natureza que expõem os indivíduos a riscos que podem afetar a saúde ou a integridade física. Não apenas refugiados estão sujeitos a este tipo de situação, mas também populações pobres e carentes, como aponta o artigo de Jefferson Brito de Souza. Um importante exemplo disso são os lixões em que não raras vezes encontramos pessoas que desenvolvem trabalhos que, apesar de não serem desejados, enquadram-se dentro de tendências socioambientais tal como a reciclagem. A dimensão do trabalho também forma personalidades, marcando vidas e a maneira de olhar o mundo. Isso acaba sendo impactante quando se trata de inserção precoce de crianças e adolescentes no mercado de trabalho. Além de ser um processo opressivo, causa impactos na vida escolar do “adulto-criança” (utilizando aqui os termos de Maria Helena Zamora e Olívia dos Santos Ribeiro), o que acompanha até a idade adulta. Todavia, este impacto ocorre não apenas deste modo, mas também quando pessoas realizam atividade profissional que gera algum tipo de influência em outro, tal qual trata Adrianne Santos em seu artigo sobre o trabalho de assistentes sociais em atendimento a idosos em abrigos, bem como o esforço de emancipação da mulher por meio do trabalho e de que maneira se manifesta na estrutura familiar, como é possível observar no artigo de Claudina Damasceno.

    A formação de um bom profissional é fundamental para garantir não apenas o exercício digno da profissão, mas também que os resultados conduzam a uma valorização maior do ser humano. A importância de uma educação permanente encontra aí seu fundamento e, para tanto, profissionais de serviço social dela necessitam não apenas para manter a qualidade de serviço diante das novas demandas do mundo do trabalho, mas também para reforças valores humanos que se encontram presentes no código de ética do profissional de serviço social. É o que trata Esteban Cipriano em seu texto. A temática das relações de trabalho e os direitos humanos é extremamente ampla. Para tanto, neste número buscamos não limitar as abordagens, mas também não foi aberto um horizonte muito vasto para não perder o foco de nossa produção acadêmica. Sendo assim, é possível aqui encontrar artigos dos mais variados campos do conhecimento, mantendo o nosso caráter interdisciplinar que desde o primeiro número nos propomos a fazer. Afinal, a perspectiva da revista, mais do que um espaço de produção universitária, visa ser um ambiente de trocas de diferentes perspectivas acadêmicas e, para tantos, as diversas abordagens apenas enriquecem o nosso trabalho, visando assim uma maior integração entre os diferentes cursos da Pontifícia Universidade Católica.

     

  • Direitos Humanos
    v. 1 n. 1 (2016)

    Editorial

    Este é o primeiro número da Dignidade Re-Vista, um periódico acadêmico destinado ao debate interdisciplinar sobre os Direitos Humanos e valores cristãos. A iniciativa de fazer esse projeto surgiu através de um grupo de estudantes envolvidos nos projetos da Pastoral Universitária Anchieta da PUC-Rio. Ao idealizar a revista, o grupo tinha dois propósitos: dar a oportunidade de publicação do primeiro trabalho acadêmico para alunos de graduação ou que estão no início da pós-graduação e ao mesmo tempo criar um espaço de divulgação e circulação de trabalhos na temática e na defesa dos Direitos Humanos e valores cristãos, independente da formação acadêmica de seus autores.

    Um dos objetivos da revista se sustenta no fato de que cada vez mais é exigido uma formação acadêmica maior para que se tenha acesso aos editais de periódicos acadêmicos, por vezes se espera que o candidato tenha doutorado, ou mesmo que já seja professor universitário. É do entendimento da equipe que compõe a Dignidade Re-vista que de fato uma sólida formação acadêmica faz com que o indivíduo reflita e pesquise sobre seus temas de interesse e assim desenvolva trabalhos mais completos. Contudo, a equipe compreende também que em boa parte dos casos a vontade de atuar no mundo acadêmico surge primeiramente como vontade de escrever e expor suas ideias. Assim, proporcionar um espaço para que os estudantes que geralmente não são privilegiados em outros editais possam escrever, e, portanto, tornar públicas as pesquisas que têm desenvolvido, é contribuir para o desenvolvimento da pesquisa científica ao despertar indivíduos para uma possível vocação para a pesquisa. Tratando do segundo objetivo deste periódico, ou seja, da divulgação de trabalhos antenados com a temática dos Direitos Humanos e valores cristãos, espera-se promover maior circulação de ideias e reflexões sobre um assunto que é de interesse de todos, uma vez que trata a respeito de uma maior liberdade e igualdade entre os indivíduos, respeito as suas diferenças e heranças culturais, além da busca pela justiça social em um mundo que tem incessantemente tentado impedi-la. Inserido nisto, pretende-se também demonstrar que o conceito de Direitos Humanos não é parte de uma discussão que se restringe somente a um grupo pequeno de disciplinas. Por ser um conceito que diz respeito à humanidade, sua aplicação cabe nos mais diferentes espaços, não somente como objeto de estudo, mas como fim.

    Neste número contamos com um total de 13 artigos aprovados para publicação. A plasticidade do eixo temático desta revista pode ser demonstrada pelos próprios trabalhos presentes nessa edição, de tema livre justamente para explicitar a interdisciplinaridade inerente ao conceito de Direitos Humanos e valores cristãos. Vemos isso tanto no trabalho do estudante de Engenharia Civil, Matheus de Paula, sobre a acessibilidade urbana e democracia, quanto no de Gabriel Vilela, estudante de Design, que propõe, através de sua área de atuação uma redução para os impactos da crise migratória dos refugiados de guerra. Já o trabalho conjunto de Ana Lídia Medeiros e Sérgio dos Santos nos mostra em uma perspectiva que une Ciências Sociais, Letras e Educação que o acesso à leitura também é um Direito Humano, uma vez que é indispensável para a Liberdade. Em chave parecida se encontra o texto do professor de História Helio Cannone que através de sua atividade como professor de pré-vestibular comunitário oferecido pela Pastoral Universitária, enfatiza a importância do conceito de experiência para a educação em Direitos Humanos. Além disso, há trabalhos que enfatizam a dimensão da fé, e, portanto, sinalizam que o respeito às especificidades culturais e a liberdade religiosa também precisam ser ideais defendidos por aqueles que sinalizam estar próximos dos Direitos Humanos. Especificamente sobre a relação entre fé e Direitos humanos contamos com o trabalho conjunto de Philippe Tavares e Igor da Silva que estabelece um diálogo entre a teologia cristã e os Direitos Humanos. Na chave de respeito e valorização das diferenças culturais, está o trabalho da estudante de Relações Internacionais Daisy Teles que promove um olhar crítico para o discurso das Operações de Paz e a promoção dos Direitos Humanos no mundo pós-colonial e o artigo de Pedro Braga, estudante de Ciências Sociais, sobre os Direitos Humanos na perspectiva dos povos tradicionais. Outros trabalhos chamam atenção para a relação entre Direitos Humanos e sociabilidade a partir das áreas de atuação das autoras. São os trabalhos de Rachel Baptista, Maria Helena Zamora e Larissa Villardo na Psicologia sobre uma proposta de família acolhedora, o de Karina Vieira que no Serviço Social trata da identidade e do racismo como construções sociais e o trabalho de Carolina Freitas que disserta sobre a influência das redes sociais no conhecimento social dos Direitos Humanos no Brasil. Finalmente temos um conjunto de artigos sobre a mulher e os Direitos Humanos. São os trabalhos de Amanda Lemos sobre respeito e valorização da mulher negra, o de Gabriele Roza que também fala da mulher negra, mas a partir do mapa da violência 2015 e a violência de gênero sofrida por estas mulheres e, por último, mas não menos importante, o texto de Kamilla Galan que nos faz pensar até que ponto as políticas sociais definem o padrão de mulher, a partir da experiência da autora no curso Projeto de Vida: Formação complementar em Direitos Humanos, oferecido pela Pastoral Universitária da PUC-Rio.

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